Artigo: Ego, Vilão ou Mocinho?

 


O termo Ego passou a ser utilizado com bastante frequência em estudos, livros e matérias sobre autoconhecimento. Da forma como é colocado, parece que o Ego é nosso inimigo, e que não nos ajuda na vida no processo de evolução, ao contrário, só promove uma série de obstáculos à manifestação equilibrada do ser. Porém, será que as pessoas estão cientes de sua importância? Será mesmo que ele só atrapalha?

Dentro de seus estudos, experiências e observação, após definir a primeira tópica, Freud percebeu a necessidade de acrescentar novas definições complementares, o qual chamou  de segunda tópica, visando organizar o modelo estrutural do aparelho psíquico.

Nota-se que a segunda tópica, constituída por Ego, ID e Superego, não exclui a primeira tópica, e sim, é um complemento. Também vale ressalvar que a distribuição de funções é um pouco diferente, embora similares.

Falando especificamente do Ego, este tem um papel fundamental da construção do senso de identidade de cada um. O ID está diretamente ligado à nossa esfera inconsciente, buscando sempre manifestar seus desejos e pulsões, sem freios os travas, buscando pela satisfação do prazer. 

Quando falamos sobre Superego, percebe-se que não corresponde inteiramente ao Pré-consciente: uma parte sua é consciente, porém uma parte também está no inconsciente. Sua função é reprimir os impulsos do Id através das sanções, regras e princípios de moral e ética, controlando estes impulsos de forma que atendam ao padrão que carrega como correto - o famoso “juízo”.  Fazendo uma analogia, se o Id é o bebê ávido por ter seus impulsos satisfeitos, que berra e esperneia enquanto a mamadeira não vem, o Superego é o pai rígido, mandão e controlador, que pune severamente quando alguém “não anda na linha”. 

Chegamos então ao papel do Ego, que seguindo a analogia, busca agir como a mãe justa e amorosa. Seu papel não é nada fácil: precisa administrar os impulsos advindos do ID, em conjunto com as sanções do Superego, de forma a manifestar os desejos e necessidades dentro de um padrão considerável aceitável. Somando-se à isso o fato de que precisa fazer tudo isso dentro de um espaço que possibilite a manifestação do ser integral, torna-se um tremendo desafio! Para ver como o Ego é acusado injustamente!

A partir destas considerações, percebe-se que o Ego está longe de ser um vilão, visto que uma parte sua também está submersa no inconsciente. Ou seja, precisa administrar esferas conflituosas e não tem conhecimento consciente pleno do que se passa!

Vale lembrar, ainda, dos mecanismos de defesa que podem ser acionados para aliviar a tensão psíquica criada neste conflito, como o recalcamento, a negação e a regressão.

O ponto, então, deixa de ser a acusação ou briga com o Ego e passa a ser a seguinte questão: como podemos permitir que o Ego trabalhe ao nosso favor?

Freud nos deu essa resposta: quando nos desenvolvemos em equilíbrio, através de estudo, informações relevantes e fortalecedoras, realizando a auto-observação, permitindo que o conteúdo do inconsciente se manifeste, e trabalhando as percepções para torná-lo consciente, desenvolvemos um Ego forte. 

Um Ego forte não é um Ego arrogante e impositivo, como muitos pensam. É uma esfera com potencial desenvolvido de autodomínio, com consistência, com consciência de si, com limites saudáveis que ajudam a manter o ID submisso, Já o Ego fraco é dominado pelos impulsos do ID, onde é possível encontrar traços (ou predominância) de imaturidade, prepotência, indisciplina, indecisão, medo, insegurança, sendo reconhecido por posturas e escolhas desastrosas.

Mais uma vez recorrendo à analogia, o Ego forte é a criança com diarreia que entende que no momento não pode comer a batata frita ou a sobremesa porque está doente e pode piorar. O Ego fraco é a criança birrenta que de tanto “reinar”, acaba obtendo permissão para comer a batata frita ou a sobremesa (ou come sem permissão mesmo) e pior, não sabe depois como lidar com as consequências.

Percebe-se então que não há a determinação por ser um vilão ou mocinho: o Ego tem papel fundamental em nossa vida e cabe a cada um encontrar subsídios para desenvolvê-lo de forma a torná-lo fortalecido o suficiente para intermediar os interesses do ID versus Superego.

Ao invés de buscar “bodes expiatórios” para evitar a tomada de consciência e o desenvolvimento do autodomínio equilibrado, vale investir em soluções efetivas que começam com o entendimento de que somos nossa própria responsabilidade. 

Não é possível o desenvolvimento de um Ego forte que funcione com base na vitimização ou negação da realidade. 

Um profissional pode ajudar a viabilizar este processo, especialmente quando a relação Ego, ID e Superego está fragmentada em demasia. Porém, ter a abertura para enxergar e transformar as próprias percepções, com acolhimento, paciência, estudo, deixando o auto julgamento de lado, sendo o objeto da própria pesquisa, analisando as informações que emergem com calma e discernimento pode ser um bom começo para transformar o Ego em nosso melhor amigo.


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