Artigo: Quem somos nós?



O que é mente? A mente sempre foi um enigma, mente e cérebro podem ser coisas distintas, mas certamente estão ligadas de alguma maneira, como é possível? Assim a alma é imortal? E qual a natureza do pensamento? O que confere a cada um a identidade pessoal? A linguagem é um ponto de partida para iniciar a discussão sobre os fenômenos mentais, a mente regula então nossos comportamentos e ações? 

Já Descartes tenta distinguir mente e corpo, ou seja, monismo (materialismo) e dualismo (espiritualismo), se a mente é separada do corpo, como posso saber qual é o meu corpo? A neurofisiologia na segunda metade do século XIX descobriu o neurônio e sua capacidade de transmitir energia elétrica, e Immanuel Kant relata que não há uma solução para o problema das relações mente-corpo, e se chegou à natureza do pensamento, sem dizer que no final do mesmo século sofremos a influência de S. Freud com novas investigações sobre a natureza da mente.

E a partir do século XX surge a filosofia da mente, almejando dar conta das relações entre fenômenos físicos e mentais, onde a análise linguística deve ser feita pelo filósofo da mente, assim se mente e cérebro são idênticos, eles têm a mesma propriedade? Há a possibilidade das máquinas terem consciência? A pergunta que nos intriga é a máquina ou a inteligência artificial pode se igualar a um ser humano? Pensar é desempenhar um conjunto de funções que frequentemente levam à produção daquilo que chamamos de comportamento inteligente, somos nós que interpretamos os movimentos do robô como se eles fossem comportamento humano, e ao fazê-lo, inconscientemente atribuímos pensamentos e intenções à máquina.

Pode existir pensamento sem consciência? Alguns filósofos da mente diriam que sem consciência não há sequer ação, quanto mais pensamento, há muitas ações que executamos de maneira inconsciente e nem por isso deixamos de nos considerar criaturas conscientes. O que faz com que eu seja eu? O que me confere identidade pessoal?

O século XX é marcado pela influência de Wittgenstein, novas metodologias de análise filosófica, neurofisiologia, psicologia cognitiva e a inteligência artificial, questões como a natureza da mente, estados de consciência e processo cognitivos, principalmente, as reflexões sobre os estados mentais com sensações, percepções, estados quasi-perceptuais, emoções, cognições e estados conativos.

Para Cláudio Costa, a consciência é a experiência integrada que a mente tem da realidade externa e interna, sendo seu conceito-chave a experiência, não há consciência sem experiência, com duas modalidades de consciência, a consciência perceptual (sentidos-realidade externa) e consciência introspectiva (autoconsciência-realidade interna), a pergunta que fica é como conciliar o fenômeno da consciência com o mundo físico. O problema metafísico é o de tornar compreensível como, em um mundo totalmente físico, se faz possível a existência de algo irredutivelmente subjetivo e fenomenal como a consciência, pois a vida é hoje naturalmente entendida como uma realidade puramente física que emerge da matéria orgânica, envolvendo processos bioquímicos e biofísicos.

De acordo com Descartes, para duvidar eu preciso existir – res extensa e res cogitans, posso colocar tudo em dúvida, meu corpo e o mundo material, menos minha própria existência, nessa relação mente-corpo, entre dualismo e fisicalismo, onde para o dualismo, a mente é distinta e independente do corpo material, enquanto o fisicalismo afirma que a mente é ela própria material, quando não lhe nega a existência.

A centralidade da mediação linguística na filosofia é substituída por uma atenção cada vez maior dos problemas relativos à mente em diálogo com a psicologia e outras ciências empíricas (virada mentalista), o pensamento é independente da linguagem? Deparamo-nos com a filosofia que busca verdades conceituais e de outro, a ciência que almeja verdades empíricas, vemos então a passagem da análise da linguagem para a análise dos fenômenos mentais.

Encontramos dois grandes problemas, o primeiro é o problema da consciência e o outro é o problema da liberdade, há determinismos neuronais ou físicos? Os estados mentais são epifenômenos da matéria? Como encontrar a compreensão da dimensão moral da vida humana diante da problemática da liberdade? A liberdade então seria uma ilusão? Diante do determinismo neuronal que pode ser a vontade livre de nosso cérebro que decide nossos comportamentos, como poderíamos alcançar a ética da responsabilidade? Como pode a consciência causar algo no mundo físico? E se a natureza da consciência for um epifenômeno, então é verídico defender que os estados mentais não são causalmente eficazes no mundo, portanto o comportamento livre não passa de uma ilusão?

Então o caminho é reduzir a mente a processos neurais no cérebro? Contudo, a natureza da consciência ainda não foi compreendida o suficiente para permitir uma definição operacional, continua sendo um mistério da ciência. Como o cérebro é um objeto físico, cientistas acreditaram que ele é a base para a elaboração de uma teoria física da mente, a ciência limitou-se a observar unicamente o fenômeno percebido, não o número subjacente, ou a coisa propriamente dita atrás do véu da realidade perceptual em cuja progressão temporal nós surfamos.


1 A CONSCIÊNCIA E A MENTE

O corpo e o cérebro participam na interação com o meio ambiente, ter percepção do meio ambiente não é, portanto, apenas uma questão de fazer com que o cérebro receba sinais diretos de um determinado estímulo, muito menos imagens fotográficas diretas. O organismo altera-se ativamente de modo a obter a melhor interface possível, o corpo não é passivo, a percepção é tanto atuar sobre o meio ambiente como dele receber sinais. O corpo contribui para o cérebro com mais do que a manutenção da vida e com mais do que efeitos modulatórios, contribuindo com um conteúdo essencial para o funcionamento da mente normal.

O primado do corpo como tema se aplica à evolução, do simples ao complexo, durante milhões de anos, os cérebros surgem a partir dos organismos que os possuem, se o cérebro evoluiu, antes de qualquer coisa, para garantir a sobrevivência do corpo, quando surgiram os cérebros mentalizados, eles começaram por ocupar-se do corpo. Não há dúvida, contudo, de que o que existe hoje é dominado por imagens não corporais, o processo de subjetividade é a característica-chave da consciência.

O presente se torna continuamente passado, e no momento em que nos apercebemos disso já estamos em outro presente, que foi gasto em planejar o futuro e se baseia nos degraus do passado, o presente nunca está aqui, assim a linguagem pode não estar na origem do eu, mas está sem dúvida na origem do eu enquanto sujeito verbal.

A consciência é o mistério final na elucidação da mente, a mente humana é algo difícil de investigar, e a consciência é o problema supremo, como a consciência pode aperfeiçoar a arte de viver? Como o cérebro no organismo humano engendra os padrões mentais? Como o cérebro produz padrões neurais, ou seja, imagens? Como se dá o ato de conhecer?

A consciência é um fenômeno inteiramente privado, de primeira pessoa, que denominamos mente; Como a consciência pode ser construída no cérebro humano? Como se dá essa relação comportamento, mente e cérebro? A consciência seria um fenômeno  biológico? Como se dá a conexão entre emoção e consciência? E nossa percepção quanto ao aprendizado, a memória e a linguagem? Sem a consciência o homem não teria evoluído? No entanto, a consciência permitiu a conexão de dois aspectos díspares do processo, de um lado a regulagem interior da vida, e de outro a produção de imagens.

A consciência tem a capacidade de regular o metabolismo humano? A consciência é conhecimento e vice-versa? Podemos concordar com a distinção entre consciência e mente? Onde a consciência é a parte da mente relacionada ao sentido manifesto do conhecimento, e a mente não é apenas a consciência, pode haver mente sem consciência, sendo assim, a consciência é um ingrediente indispensável da mente humana criativa, porém não é toda a mente humana. A consciência seria um intermediário? Que serviria para tomar conhecimento da vida? A consciência começa quando os cérebros adquirem o poder, de contar uma história sem palavras?

A consciência é o estado de alerta, e o estado de consciência é a totalidade dos processos mentais, parece que o cérebro pode ser uma raiz ou local de entrada da força do campo noético da consciência, o cérebro controla o corpo? O corpo atua como uma garrafa magnética para acoplar e dar uma base para a onda estacionária da realidade percebida e para abrigar temporariamente a alma. A alma então pode ser definida como o espírito no corpo, o que, é claro, tem conotações tanto temporais quanto eternas, e o cérebro-corpo se torna um processador entre a temporalidade e a atemporalidade, a tarefa corporal é semelhante à função última do cérebro.

Portanto, o corpo inteiro, e não somente o cérebro, é parte da mente? O cérebro seria um mecanismo clássico que atua como um processador? A consciência então seria um princípio cósmico, sendo a luz da mente com o poder organizador mais profundo do que a gravitação que controla o universo? Conhecer a mente humana é o próximo passo evolucionário?


CONCLUSÃO

Se o sujeito humano não pode agir no mundo físico, não se pode defender a tese de responsabilidade moral e fala de ética, o que é o ser humano? Quem somos nós? É possível responder essas perguntas? Diante dessa interação causal entre espírito e matéria, consciência e cérebro, qual é a sua constituição ontológica? Na ação humana pode existir liberdade? Será que a consciência e o cérebro interagem? Qual é o princípio de responsabilidade para uma civilização tecnológica? Qual é a natureza desse fenômeno chamado consciência? O que significa dizer que somos seres livres?

A ideia de H. Jonas é que o espírito emergiu do mundo físico num processo evolutivo, o que faz de espírito e matéria duas dimensões de um mesmo ente orgânico e consciente. Apenas o organismo vivo seria a testemunha mais evidente de que o espírito já estaria presente na natureza, no organismo, encontram-se elementos de liberdade, subjetividade e interioridade que desmentem o fato de que a natureza é algo totalmente alheio à res cogitans.

Precisamos de uma nova ética que inclua o valor da natureza em seu raio de reflexão, almejando revolucionar a ontologia a partir do fenômeno da vida. O determinismo e o acaso são um paradoxo, sem liberdade ou capacidade para escolher o próprio destino, não haveria sentido falar em responsabilidade moral, arrependimento ou remorso. Garantindo a liberdade por meio de uma ética da responsabilidade, dois requisitos básicos, agir por convicções e ser agende que pode escolher, pois a pessoa tem autonomia quando está em posse da própria vontade, um ato livre parece ser uma característica da pessoa como um todo, o cérebro não pode decidir nada, quem decide é a pessoa.

Quanto maior for a liberdade, menor será a necessidade, a liberdade nasce no seio das leis revolucionárias da natureza e continua sua trajetória no ser, sempre com a necessidade das leis, porque o conceito de liberdade se amplia e se torna uma propriedade não apenas da pessoa consciente, mas de todo organismo vivo. Por fim, não conseguimos responder diretamente o que somos, para onde vamos e como vamos, o home continua sendo um mistério.

Autoria:


REFERÊNCIAS

AMOROSO, Richard L. Francisco Di Biase. A revolução da consciência: novas descobertas sobre a mente no século XXI. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.

COSTA, Claudio. Filosofia da mente. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005. 

DAMÁSIO, António R. O erro de Descartes: emoção, razão e cérebro humano. – São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

DAMÁSIO, António R. O mistério da consciência: do corpo e das emoções ao conhecimento de si. – São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

VIANA, Wellistony C. Hans Jonas e a filosofia da mente. – São Paulo: Paulus, 2016. Coleção Ethos.

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